OLAVO PASCUCCI

O pensamento vivo, hirto e pulsante do engenheiro Olavo Pascucci.

14 setembro 2012

RECONHECIMENTO TARDIO



Certa feita, quando este autor andava pela casa dos vinte-e-poucos (anos, não centímetros) e não conhecia a xavasca importada senão das revistinhas dinamarquesas que folheara, na infância profunda, nas aulas de catequese do Colégio São Bento, resolveu fazer uma degustação tão ampla quanto variegada do produto onde se o achava com mais disponibilidade. O leitor sofisticado fará um muxoxo de nojo, enquanto limpa o jato de esperma das sobrancelhas, a qualquer sugestão de que esse idílico Epcot Center das xoxotas esteja em Nova York ou qualquer outro grande centro do melting pot americano. Parbleu!, dirá, sentando meio torto na ottomane que lhe decora a alcova, antes de explicar que o local ideal para empreitadas gastronômicas desse porte é, naturalmente, Florença.

E, com efeito, em nenhuma outra cidade da Terra haverá tamanha profusão da espécie mais fodeca de tantas em quantas se dividirá o gênero feminino: a estudante de arte. De modo que de lá voltei com a caralha meio gasta, mas saciada da sova de xavascas fulvas, ruivas e transversas que levou, pobrezinha, de moçoilas escandinavas, americanas e japonesas (respectivamente). 

No vôo de volta, sentou-se ao meu lado um rapazinho evidentemente pederasta, que aparentemente fizera o mesmo trajeto com ambições puramente intelectuais. Falou-me da Uffizi e dos perobos renascentistas que se alternavam entre pintar matronas incomíveis e esculpir florentinas trosobas tristes (e moles), e fê-lo com a afetação que era lícito esperar dum representante de seu grêmio. Quando, algo tímido, insinuei que percorrer todo o museu numa tarde se me revelara programa cansativo, o rapazola sentenciou-me em tom superior, com o indefectível dorso da mão na cintura:

— Isso é porque você não é como eu, um apaixonado pela arte.

Estas reminiscências vêm a troco do artigo Arte Séria, publicado pelo sr. Alexandre Soares da Silva na edição deste mês da revista Alfa (com a bucetuda Sabrina Sato na capa). No texto, o autor desenvolve mais ou menos o mesmo ponto que eu, ao obtemperar que "é preciso desconfiar dessa gente que vive fazendo loas à Alta Cultura" e que "declarar amor à Alta Cultura é como declarar amor à Justiça e aos bons sentimentos: a marca dos canalhas". Desenvolve-o, no entanto, sem jamais ir ao âmago da questão: além de canalhas, é coisa de quem aprecia mesmo é uma sólida pra-te-leva pulsante a magoar-lhe furiosamente as paredes do intestino grosso e, quiçá, do delgado.

Mas não pretendo abusar da paciência do leitor com um libelo contra a alta cultura ou, mais exatamente, contra essa raça vil que não resiste a declarar seu amor por cousas mais elevadas a qualquer cristão que lhes conceda trinta segundos de atenção imerecida. Não: se hoje abandono a gravação que fiz da Fátima Bernardes de rabo-de-cavalo em Encontro — gravação que guardei para inspirar-me imaginando serventias que eu daria para o dito rabo-de-cavalo enquanto diria cousas porcas à MILF quintessencial da televisão brasileira —, e se hoje torno a incomodar o público leitor, é apenas para assinalar que a mesma reportagem, à página 50, dedica um espaço a este vosso criado na Pequena lista de coisas que realmente importam agora, onde figuro ao lado de ninguém menos que Mario Benedetti e — estranhamente, para quem decerto leu minhas ponderações sobre a Baitolagem emQuadrinhos — de um site dedicado a gibis da Marvel.

Faço votos de que o reconhecimento tardio a este que o sr. Soares Silva qualifica como "um dos melhores escritores vivos da língua portuguesa" incremente substancialmente a quantidade de cus de jornalistas que tenho logrado perfurar neste meu magistério. Cus femininos, esclareço, para pôr fim à algazarrinha prematura dos que se deixam emocionar por substantivos comuns-de-dois-gêneros. Caralho.